1984 (português)

10.

Quando acordou, Winston teve a sensação de ter dormido muito tempo, porém ao olhar para o relógio antiquado verificou que eram apenas oito e meia da noite.

Era um capricho e nada mais,

Doce como um dia de abril,

Mas seu olhar azul de anil

Roubou para sempre a minha paz!

Pelo jeito a canção piegas continuava fazendo sucesso. Ainda era ouvida em toda parte. Resistira à “Cantiga do ódio”. Julia acordou com a melodia, espreguiçou-se deleitosamente e saiu da cama.

“Estou com fome”, disse. “Vamos fazer mais um pouco de café. Que droga! O fogareiro apagou e a água está fria.” Pegou o fogareiro e deu uma chacoalhada. “Acabou o querosene.”

“O velho Charrington deve ter um pouco para nos emprestar.”

“O gozado é que eu tinha certeza de que estava cheio. Vou me vestir”, acrescentou ela. “Parece que esfriou.”

Winston também se levantou e vestiu-se. A voz cantarolava, incansável:

Dizem que o tempo tudo cura

E que no fim sempre se esquece,

Mas risos e choros — até parece

Que a vida passa e eles perduram!

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